Estratégias Para Regular o Emocional do Paciente na Psicanálise

A evocação de memórias passadas, para Freud, só poderia ser terapêutica se acompanhada do reviver do afeto associado às mesmas, dentro do setting analítico, já que nos primórdios da psicanálise afeto e representação eram dois pares indissociáveis.  Tendo isso em mente, podemos inferir que a regulação emocional refere-se aos processos que um indivíduo utiliza para gerir e responder às suas experiências emocionais de forma adequada e adaptativa. Abrange estratégias para amplificar, manter ou diminuir as respostas emocionais e envolve uma série de estratégias, que ajudam o paciente a lidar com situações difíceis e a ter controle emocional.

A regulação emocional eficaz é associada a uma série de resultados positivos, incluindo melhoria do bem-estar, melhores relações interpessoais e maior resiliência face ao stress e à adversidade. Ser capaz de regular as emoções é uma habilidade que pode ser desenvolvida com a ajuda da psicanálise, sendo que algumas pessoas podem achar mais fácil do que outras regular suas emoções.

A regulação emocional não deve ser confundida com a eliminação ou controle das emoções, mas com a moderação da experiência das emoções vivenciadas. Isto inclui a capacidade de alterar a intensidade ou duração de uma emoção, em vez de alterá-la completamente. Ser capaz de moderar a intensidade da emoção pode ajudar a controlar o comportamento e as reações emocionais. Quando uma emoção é sentida, esta pode ser desencadeada quando o indivíduo se sente ameaçado ou impotente, sendo uma reversão de conteúdo da transformação do amor pelo ódio (‘Os Instintos e Suas Vicissitudes’, Obras Completas de Freud Volume XIV).

O analista, dentro do setting analítico, deve ter como meta ajudar o paciente a ser capaz de regular as emoções, já que as emoções estão intimamente ligadas à forma de pensar e agir. Os pensamentos e sentimentos, dentro do conjunto de recursos e procedimentos oferecidos pela psicanálise ao paciente, ajuda-o a decidir a melhor forma de responder a uma situação e que medidas devem ser tomadas, ou não, já que a regulação emocional pode influenciar o comportamento. Juntos, analista e paciente, desenvolvem habilidades para regular as emoções e a não agir impulsivamente, fazendo escolhas ponderadas, aprendendo a administrar relacionamentos com outras pessoas, resolver problemas e ter melhor controle sobre sua saúde mental.

O analista é capaz de observar se emoções do paciente foram reprimidas e, utilizando-se das técnicas oferecidas pela psicanálise, ajudar o paciente a entender e  resolver seus sentimentos de impotência, pensamentos negativos,  ressentimentos e o consequente aumento da frustração, o que pode resultar no desenvolvimento de ansiedade, depressão ou até mesmo em queixas físicas, como observado em pacientes neuróticos. O par analista-paciente deve trabalhar as forças psíquicas que dão origem ao possível recalcamento da restauração das lembranças, já que quanto maior  a resistência do paciente, mais profunda é a distorção delas, dificultando o processo de cura de sofrimentos psíquicos. Pacientes que experimentam regularmente emoções negativas, intensas e avassaladoras são muito mais propensos a confiar em estratégias prejudiciais individuais, dificultando  a sua vida psíquica.

A má regulação emocional geralmente vem desde a infância, sendo determinadas pelas manifestações infantis da sexualidade. Abaixo estão alguns indicativos que podem ser observados no setting analítico:

  • ·    Temperamento: determinado principalmente pela herança genética, geralmente é estável ao longo do tempo e das situações. Pode ser possível que algumas crianças desenvolvam uma regulação emocional deficiente devido ao seu temperamento. As diferenças de temperamento podem ser observadas desde muito cedo na vida. Alguns bebês são calmos e de temperamento equilibrado, enquanto outros tendem a ter reações de estresse mais intensas e prolongadas, o que pode contribuir para uma regulação emocional mais deficiente.

 

  • ·     Trauma: descrito como a experiência de um afeto catastrófico que um indivíduo não consegue processar, compreender e/ou integrar. A intensidade avassaladora dos sentimentos pode congelar ou desligar automaticamente a consciência. Quanto mais trauma um indivíduo sofreu quando criança, maior será a probabilidade de sofrer desregulação emocional grave.

 

Sabemos, segundo Freud, que na infância a pulsão sexual não está centrada e é, à princípio, desprovida de objeto. As primeiras experiências de apego moldam as habilidades de regulação emocional. Os bebês precisam de cuidadores que ajudem a modular seus afetos por meio de vínculos sintonizados. Sem isso, as crianças não conseguem desenvolver capacidades auto calmantes e, em vez disso, dependem da regulação externa.

Estilos de apego inseguros envolvem sintonia parental abaixo do ideal. Os cuidadores podem ser inconsistentes, indisponíveis, extremos ou ausentes. As crianças internalizam essas dinâmicas, aprendendo hábitos de regulação prejudiciais, como supressão ou emotividade dramática. Os padrões codificados persistem na idade adulta como desregulação emocional.

Numa situação angustiante, o paciente com habilidades inadequadas de regulação emocional experimenta sofrimento relacionado a emoções negativas e falta de controle sobre suas emoções. Ao agir de acordo com suas emoções desreguladas, o paciente pode acabar se comportando de maneira a se sobrecarregar ainda mais, ficando em um  ciclo emocional vicioso. O analista deve saber interpretar a desregulação destas emoções, que em geral situam-se num espectro entre estilos sub regulamentados e excessivamente regulamentados, ambos tornando difícil ao paciente se acalmar e retornar aos estados emocionais básicos. Um paciente com desregulação emocional pode manifestar  sentimentos de entorpecimento, raiva,  explosões violentas, comportamento impulsivo e imprudente, abuso de substâncias e comportamentos auto lesivos.

O setting analítico deve proporcionar o reconhecimento de emoções desagradáveis, como tristeza, raiva ou medo, por exemplo. Ao nomear a emoção, muitas vezes o paciente faz com que ela perca seu poder, podendo se libertar de parte da dor e do desconforto que acompanham a emoção desagradável. O paciente que não tem clareza sobre as suas emoções também é menos consciente e menos claro sobre as suas necessidades psicológicas.

Ao paciente é fundamental reconhecer que suas emoções estão presentes por um motivo válido e que estão lhe dizendo algo e seu par no setting analítico deve fazê-lo entender  que sentir fortes emoções negativas é uma parte normal da vida, mas que é preciso entender as reações a estas e tratá-las, quando se evidencia uma desregulamentação emocional.

O objetivo do tratamento psicanalítico é eliminar possíveis amnésias, em geral sobre fatos acontecidos na infância,  preenchendo todas as lacunas da memória e esclarecendo todos os efeitos enigmáticos da vida psíquica, ajudando o paciente a realizar sua desregulação emocional, tratá-la e atingir seu ideal do ego.

 

 


 

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